Com a celebração das Cinzas, na
Quarta-feira, 14 de fevereiro, tem início o tempo especial da Quaresma, tempo
de preparação para a Páscoa do Senhor. Em toda a Igreja, estes 40 dias de
peregrinação espiritual e comunitária representam um convite a aprofundar e
levar a sério a vida e a fé que lhe dá sentido, tanto a nível pessoal como
relacional.
A atitude de Quaresma é como a
de alguém que se prepara para participar num grande acontecimento desportivo
ou numa festa muito significativa de família ou de grupo. A consideração
daquilo que está em jogo dá energia para se preparar, vencer obstáculos,
envidar esforços e colaborar com os outros para que se alcancem os objetivos em
vista. Não se trata de cortar a alegria e o gosto de viver. Pelo contrário,
trata-se de dar fundamento à felicidade e à vida, sabendo que isso comporta
também renunciar a coisas supérfluas ou contraditórias com os objetivos e
esforçar-se como o atleta que se prepara para a competição.
A Igreja propõe, particularmente, três
meios concretos para fazer este caminho Quaresmal: a oração
centrada na Palavra de Deus, o jejum como
exercício de libertação e a esmola como expressão do amor
solidário.
Escutar/Ler a Palavra de Deus e dirigir
a Ele a nossa palavra na oração é o essencial da vida crente, pois
é desse modo que nos abrimos ao amor, à força e à sabedoria de Deus para
conduzir a nossa vida. Esta é a primeira atitude de cada pessoa que crê. Neste
ano em que tomamos a realidade familiar como centro da nossa vida diocesana, é
importante que a Quaresma seja bem utilizada para fazer crescer em nossas casas
o espírito de oração. Ao juntar-nos à mesa ou antes de dar as boas noites, é
bom que levantemos o coração para o Pai do Céu, que escutemos uma passagem do
Evangelho, que O louvemos e peçamos que ilumine e dê sabor e força à nossa
vida, à nossa Igreja, ao mundo.
A atitude de jejum é um elemento
importante, tanto na alimentação como em outros aspetos da vida. Habitua-nos a
saber controlar os nossos desejos e a orientá-los corretamente, de tal modo que
não danifiquem a nossa saúde e a nossa vida, atendendo igualmente às
necessidades dos outros. Não é apenas um emagrecimento estético; dá-nos uma
maior liberdade em relação a nós próprios e uma nova estética humana e moral,
na solidariedade para com os que necessitam ainda mais do que nós. Renunciar
àquilo que me dá gozo, em favor de alguém, não é apenas uma questão alimentar;
é uma atitude de vida, segundo o modelo de Cristo.
A esmola está ligada à atitude
de jejum, como expressão do amor solidário para com quem se encontra em
dificuldade. Partilhar é seguir o exemplo de Cristo que “sendo rico, se
fez pobre por vós, para vos enriquecer com a sua pobreza” (2Co 8,9).
Também aqui, não se trata simplesmente de dar uma moedinha, mas de ter
“com-paixão” de quem sofre, de fazer próprias as dificuldades dos outros, de
partilhar aquilo que recebemos de Deus. Não é só o dinheiro que conta.
Importante é igualmente a “esmola” do tempo que se passa ao lado de alguém, do
perdão que se oferece, de um sorriso que ilumina a vida, de um gesto que rompe
gelos de desconfiança e de ódio.
Estas são sugestões para agitar a nossa
vida e fazer-nos despertar para os outros, para a família, para a comunidade, a
paróquia, a Diocese e a Igreja na sua universalidade. Certamente, em
cada paróquia, haverá gestos concretos onde nos podemos inserir para
caminhar juntos nesta Quaresma, em direção à Páscoa. Procuremos estar atentos e
participar, pois a festa da Páscoa deve contar com o contributo de todos.
A nível da nossa Igreja Diocesana,
propõem-se dois sinais como expressão desta caminhada:
Como escuta da Palavra de Deus,
vamos ler e meditar o Evangelho de São Marcos. Eu próprio orientarei estas
sessões destinadas a um estudo reflexivo do primeiro Evangelho, como caminho
para a Quaresma da vida. As indicações são as seguintes:
- Leitura do Evangelho de São Marcos
- Seminário de São Paulo – Almada
- À quinta-feira, das 21h00 às 22h45
- Durante o tempo da Quaresma e da Páscoa
- Início a 22 de fevereiro
Como sinal de jejum e esmola
solidária, juntaremos aquilo que pusermos de parte durante a Quaresma,
individualmente ou em família, e entregaremos nas nossas paróquias, consoante
for determinado. O produto dessa partilha será destinado a duas obras de
caridade. Uma parte destina-se a ir ao encontro de uma comunidade carenciada
que está a surgir no Segundo Torrão – Trafaria. Outra parte destinar-se-á às
comunidades cristãs em situação de perseguição e enorme necessidade na Síria e
no Iraque. Assim, a nossa renúncia destinar-se-á a:
- Estrutura de apoio à nova comunidade do Segundo Torrão – Trafaria;
- Comunidades Cristãs na Síria e no Iraque.
Que o Senhor abençoe e ilumine este
nosso percurso quaresmal, revitalizando a nossa vida na comunhão com Ele e
guiando as nossas atitudes, na família, na Igreja e na sociedade onde nos
inserimos, como testemunhas do seu Evangelho.
Setúbal, 6 de fevereiro de 2018
+ José Ornelas Carvalho
Bispo de Setúbal
Bispo de Setúbal