Mt 25,14-30 A parábola
do Evangelho de hoje fala-nos de dons. Diz-nos que somos destinatários dos talentos de Deus, «cada qual conforme
a sua capacidade» (Mt 25, 15). Antes de mais nada, reconheçamos isto: temos
talentos, somos «talentosos» aos olhos de Deus. Por isso ninguém pode
considerar-se inútil, ninguém pode dizer-se tão pobre que não possua algo para
dar aos outros. Somos eleitos e abençoados por Deus, que deseja cumular-nos dos
seus dons, mais do que um pai e uma mãe o desejam fazer aos seus filhos. E
Deus, aos olhos de Quem nenhum filho pode ser descartado, confia uma missão a
cada um.
De facto, como Pai amoroso e exigente que é,
responsabiliza-nos. Vemos, na parábola, que a cada servo são dados talentos
para os multiplicar. Mas enquanto os dois primeiros realizam a missão, o
terceiro servo não faz render os talentos; restitui apenas o que recebera: «Com
medo – diz ele –, fui esconder o teu talento na terra. Aqui está o que te
pertence» (25, 25). Como resposta, este servo recebe palavras duras: «mau e
preguiçoso» (25, 26). Nele, que desagradou ao Senhor? Diria, numa palavra
(talvez caída um pouco em desuso mas muito atual), a omissão. O seu mal foi o
de não fazer o bem. Muitas vezes também nos parece não ter feito nada de mal e
com isso nos contentamos, presumindo que somos bons e justos. Assim, porém,
corremos o risco de nos comportar como o servo mau: também ele não fez nada de
mal, não estragou o talento, antes guardou-o bem na terra. Mas, não fazer nada
de mal, não basta. Porque Deus não é um controlador à procura de bilhetes não
timbrados; é um Pai à procura de filhos, a quem confiar os seus bens e os seus
projetos (cf. 25, 14). E é triste, quando o Pai do amor não recebe uma generosa
resposta de amor dos filhos, que se limitam a respeitar as regras, a cumprir os
mandamentos, como jornaleiros na casa do Pai (cf. Lc 15, 17).
O servo mau, uma vez recebido o talento do Senhor
que gosta de partilhar e multiplicar os dons, guardou-o zelosamente,
contentou-se com salvaguardá-lo; ora não é fiel a Deus quem se preocupa apenas
de conservar, de manter os tesouros do passado, mas, como diz a parábola,
aquele que junta novos talentos é que é verdadeiramente «fiel» (25, 21.23),
porque tem a mesma mentalidade de Deus e não fica imóvel: arrisca por amor,
joga a vida pelos outros, não aceita deixar tudo como está. Descuida só uma
coisa: o próprio interesse. Esta é a única omissão justa.
E a omissão é também o grande pecado contra os
pobres. Aqui assume um nome preciso: indiferença. Esta é dizer: «Não me diz
respeito, não é problema meu, é culpa da sociedade». É passar ao largo quando o
irmão está em necessidade, é mudar de canal, logo que um problema sério nos
indispõe, é também indignar-se com o mal mas sem fazer nada. Deus, porém, não
nos perguntará se sentimos justa indignação, mas se fizemos o bem.
Como podemos então, concretamente, agradar a Deus?
Quando se quer agradar a uma pessoa querida, por exemplo dando-lhe uma prenda,
é preciso primeiro conhecer os seus gostos, para evitar que a prenda seja mais
do agrado de quem a dá do que da pessoa que a recebe. Quando queremos oferecer
algo ao Senhor, os seus gostos encontramo-los no Evangelho. Logo a seguir ao
texto que ouvimos hoje, Ele diz: «Sempre que fizestes isto a um destes meus
irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes» (Mt 25, 40). Estes irmãos mais
pequeninos, seus prediletos, são o faminto e o doente, o forasteiro e o
recluso, o pobre e o abandonado, o doente sem ajuda e o necessitado descartado.
Nos seus rostos, podemos imaginar impresso o rosto d’Ele; nos seus lábios,
mesmo se fechados pela dor, as palavras d’Ele: «Isto é o meu corpo» (Mt 26,
26). No pobre, Jesus bate à porta do nosso coração e, sedento, pede-nos amor.
Quando vencemos a indiferença e, em nome de Jesus, nos gastamos pelos seus
irmãos mais pequeninos, somos seus amigos bons e fiéis, com quem Ele gosta de
Se demorar. Deus tem em grande apreço, Ele aprecia o comportamento que ouvimos
na primeira Leitura: o da «mulher forte» que «estende os braços ao infeliz, e
abre a mão ao indigente» (Prv 31, 10.20). Esta é a verdadeira fortaleza: não
punhos cerrados e braços cruzados, mas mãos operosas e estendidas aos pobres, à
carne ferida do Senhor.
Lá, nos pobres, manifesta-se a presença de Jesus,
que, sendo rico, Se fez pobre (cf. 2 Cor 8, 9). Por isso neles, na sua
fragilidade, há uma «força salvífica». E, se aos olhos do mundo têm pouco
valor, são eles que nos abrem o caminho para o Céu, são o nosso «passaporte
para o paraíso». Para nós, é um dever evangélico cuidar deles, que são a nossa
verdadeira riqueza; e fazê-lo não só dando pão, mas também repartindo com eles
o pão da Palavra, do qual são os destinatários mais naturais. Amar o pobre
significa lutar contra todas as pobrezas, espirituais e materiais. E isto far-nos-á bem: abeirar-nos de quem é mais
pobre do que nós, tocará a nossa vida. Lembrar-nos-á aquilo que conta
verdadeiramente: amar a Deus e ao próximo. Só isto dura para sempre, tudo o
resto passa; por isso, o que investimos em amor permanece, o resto desaparece.
Hoje podemos perguntar-nos: «Para mim, o que conta na vida? Onde invisto?» Na
riqueza que passa, da qual o mundo nunca se sacia, ou na riqueza de Deus, que dá
a vida eterna? Diante de nós, está esta escolha: viver para ter na terra ou dar
para ganhar o Céu. Com efeito, para o Céu, não vale o que se tem, mas o que se
dá, e «quem amontoa para si não é rico em relação a Deus» (cf. Lc 12, 21).
Então não busquemos o supérfluo para nós, mas o bem para os outros, e nada de
precioso nos faltará. O Senhor, que tem compaixão das nossas pobrezas e nos
reveste dos seus talentos, nos conceda a sabedoria de procurar o que conta e a
coragem de amar, não com palavras, mas com obras.